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Geopolítica em Pixels: Command & Conquer e a representação dos inimigos dos Estados Unidos

No ano de 1995 era lançado a primeira versão do jogo "Command & Conquer" (Westwood Studios, 1995), um jogo de estratégia em tempo real, onde o jogador assume o papel de um comandante que administrando bases militares vai extraindo recursos, construindo instalações e unidades militares para derrotar o adversário. A série C&C tornaria-se um marco na história dos games, sendo aclamada por jogadores e revistas especializadas como um clássico do estilo.

A narrativa do jogo é iniciada com a descoberta de um mineral (Tiberium) que, devido ao seu potencial econômico, é transformado no recurso natural mais importante para a humanidade, gerando um conflito em escala global. Para o jogador são colocados a disposição o controle de dois exércitos, GDI e NOD. O primeiro (Global Defense Initiative - Iniciativa de Defesa Global) é um braço direito da ONU e representa a defesa dos países pertencentes ao lado ocidental/democrático, já o segundo (Brotherhood of NOD - Irmandade do Nod) é um misto de grupo terrorista e sociedade secreta com aspectos religiosos, seguidores de um líder carismático chamado Kane.

Apesar da GDI ser representante das Nações Unidas, alguns aspectos dessa organização remetem ao poderio dos Estados Unidos, seja na águia - que remete ao patriotismo ianque ou na sua proposta de ser "xerife do mundo", protegendo as demais nações de líderes carismáticos, terrorismo e mantendo a ordem mundial.

Um ano após o lançamento do jogo original, é lançada uma nova versão, intitulada "Command & Conquer: Red Alert" (Westwood Studios, 1996), o novo jogo também inicia uma nova série dentro do universo do game, a série Red Alert (Alerta Vermelho). E o que outrora era relativamente escondido, agora passa por uma representação direta do inimigo que deve ser combatido, físico e ideologicamente.

A série "C&C: Red Alert" adapta elementos da realidade para criar o pano de fundo do enredo do jogo. Tudo se inicia na Segunda Guerra Mundial, quando Albert Einstein cria uma máquina do tempo e consegue eliminar os planos de Adolf Hitler, impossibilitando a criação das ideias nazistas e suas consequências nefastas, como a segunda guerra mundial, o holocausto e a ascensão do fascismo no continente europeu. Entretanto, apesar dos esforços, um novo inimigo surge, dessa vez mais poderoso e praticamente indomável, a União Soviética.

O Alerta Vermelho ao qual o título faz referência é o poder e desenvolvimento da União Soviética como potência mundial. Como não houve uma segunda guerra mundial, essa nação pode se desenvolver sendo liderada por Josef Stalin que, aliando uma política de expansionismo, foi capaz de invadir e conquistar a China e o leste europeu. Um cordão sanitário é criado para impedir a proliferação de ideias comunistas na Europa ocidental, não restando outra alternativa para as nações democráticas europeias senão à guerra. Mais uma vez se faz presente à necessidade de defesa.

Na segunda versão de "Command & Conquer: Red Alert 2" (EA Games, 2000), o leque de inimigos é ampliado, incluindo Iraque¹, China, Cuba e Líbia, além da ameaça constante da União Soviética, acentuando o alerta vermelho². O aspecto ideológico não é o único elemento que coloca em lados opostos as facções que podem ser controladas pelo jogador, além de suas motivações, o aparato tecnológico dos exércitos é diferenciado, enquanto o lado dos aliados utiliza tecnologia de ponta como laser, os inimigos utilizam táticas como terrorismo e armas químicas.

Uma terceira série do jogo é iniciada em 2003, Command & Conquer: Generals (Eletronic Arts, 2003). O novo jogo se aproxima da contemporaneidade colocando inimigos reais que podem ser ameaças autênticas à democracia e ao modo de vida propagados pelos Estados Unidos da América. Em C&C Generals o jogador pode controlar três grupos distintos: Estados Unidos, China e a GLA (Global Liberation Army - Exército de Libertação Global) um grupo muçulmano que utiliza técnicas terroristas, intimidação e armas químicas, sendo apoiado por lideranças árabes islamizadas.


Nas imagens de divulgação do jogo, como a que se encontra ao lado, os líderes dos grupos são representados em posição de destaque. O caráter militar, que é um dos aspectos primordiais da série, é enfatizado. O representante dos Estados Unidos assume posição central, enquanto as demais nações são postas em plano secundário. Além disso, os generais da China e dos Estados Unidos são condecorados, enquanto o líder islâmico é representando tal qual um rebelde.


As representações imagéticas e discursivas presentes no jogo são compostas por interpretações de um governo democrático que luta pela defesa de sua soberania e ideias de liberdade e democracia,configurados pelos EUA. A China é demonstrada como uma superpotência que utiliza o poder da sua população e as técnicas bélicas para se tornar um gigante. E por fim, o GLA, grupo terrorista que utiliza técnicas não ortodoxas, até para um jogo de estratégia, para conseguir seus objetivos.


Quando o jogador escolhe liderar determinada facção, são colocadas a disposição diversas estruturas e unidades para controle, podendo gerenciar recursos, como o petróleo, e produzir mais tropas para obter a soberania do cenário e derrotar as tropas inimigas. Quando é selecionado o GLA, o jogador tem a possibilidade de controlar trabalhadores, os quais são cidadãos obrigados a trabalhar para o exército. Comumente pode-se ouvir dos trabalhadores, quando selecionados, frases como "Do not hurt me", "I will obey" "I'm hungry" "Can I have some shoes?"³. Representação oposta ao que é demonstrado quando o jogador decide controlar as tropas dos Estados Unidos que afirmam que vão defender o seu país e a liberdade.


Outro ponto que pode ser destacado são as unidades do GLA, dos três grupos jogáveis, são os únicos que não possuem suporte aéreo (Os Estados Unidos possuem os caças F-22 e F-117 e a China o caça MIG 29). As unidades do grupo terroristas são representadas como rebeldes armados, multidões enfurecidas, atiradores de elite, sequestradores de veículos, homens e carros bombas. Além de tanques, modelo Scorpion, e veículos urbanos adaptados para o combate no deserto, a estratégia do exército é a prática do terror, aliado com armas químicas.





 

¹ Basta lembrar das batalhas pessoais entre os governos Bush e o Iraque, na Guerra do Golfo (1990-1991) e na Guerra ao Iraque (2003) tornando o Iraque um inimigo declarado dos Estados Unidos.

² A série Red Alert vai ter ainda um terceiro título "Command & Conquer: Red Alert 3"(Eletronic Arts, 2008) que vai incluir uma nova fação, o Empire of Rising Sun (Império do Sol Nascente), que faz alusão ao Japão. Contra os países aliados (Estados Unidos, Inglaterra, França e Alemanha) e a União Soviética e seus adeptos.

³ Respectivamente "não me machuque", "eu vou obedecer", "estou faminto" "eu poderia ter alguns sapatos?"

 

Como citar este artigo:

LIMA, Hezrom Vieira Costa. Geopolítica em Pixels: Command & Conquer e a representação dos inimigos dos Estados Unidos. (Artigo) In: História em Jogo. Disponível em: http://www.hezromvieira.wixsite.com/historiaemjogo. Publicado em: 9 jan. 2018. Acesso: [informar a data do acesso].

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